“Maçadeiras do meu linho
Maçai o meu linho bem.
Não olheis para a portela
Que a merenda logo vem.

Ai, vem
Que a merenda logo vem,
Que a merenda logo vem.
Aquele homem que aí vai
Ai, quem mo dera ver cair
Com as costas numa laja
Muito m’haveria de rir.

(..)

Se quereis que eu mace o linho
Eu aqui tenho a maça
Se não tiveres dinheiro
Eu também maço de graça.”

Em Várzea de Calde – Viseu, os cantares marcavam todos os momentos sociais e acompanhavam os trabalhos, quer fosse no campo ou a transformação do linho, cujo cultivo pintava de azul e amarelo a paisagem.
Ao fiar, nos longos serões, era comum entoar-se:

“A fiadeira da cor dourada
É uma pequena
Toda engraçada.
Toda engraçada
Engraçadinha
A fiadeira
A fiadeirinha.

Dava-te o meu coração
Ai, Se mo tivesses pedido
Agora já to não dou
Ai, já o tenho prometido.

(…)

O meu coração é terra
Ai, hei de o mandar lavrar
Os meus olhos já se obrigam
A dar água para o regar.

A fiadeira da cor dourada
É uma pequena
Toda engraçada
Toda engraçada
Engraçadinha.
A fiadeira
A fiadeirinha.”

O testemunho chega-nos através de Maria de Jesus Gonçala Chaves, nascida, em 1940, no seio de uma família muito religiosa, em Várzea de Calde – Viseu, terra dos seus pais, Delfim de Almeida Chaves e Laurentina Pereira Gonçala. Filha mais velha de sete irmãos, o pai era lavrador e tinha a arte de carpinteiro, enquanto a mãe trabalhava em casa e no campo.

Os cantares faziam parte do dia-a-dia da comunidade, recorda, garantindo, no seu caso, que trabalhava “com alegria, na voz e no coração”. Quer fosse a sachar o milho, na malha do centeio, na cegada do centeio, a maçar ou a tascar linho, a fiar à luz da candeia a petróleo, nas idas ao moinho ou a regar os campos, “andava sempre a cantar”.
Tinha cerca de 14 anos, idade com que “começou a chegar às apienhas [pedais do tear] com os pés, quando começou a tecer, uma arte que aprendeu com a avó paterna. Aos 17 já fazia todos os processos sozinha.

Assim, nos meses mais quentes trabalhava na resina e o inverno era passado no tear para ganhar algum dinheiro para ajudar a criar os irmãos. Fazia teias de linho e de burel, tecia mantas de farrapos, colchas de lã natural de ovelhas, panos de algodão e tapetes. Também bordava, e as peças “ficavam lindas”, garante.