Na sociedade contemporânea existe um fenómeno cultural de solidão e de afastamento em relação à comunidade. Eu queria encontrar novas formas de estabelecer ligações com uma comunidade mais alargada. Esse foi um dos temas que atravessou o meu trabalho. As conversas banais e um certo sentimento de estranheza também se incorporam nos meus trabalhos. A maior parte das minhas peças vídeo/performativas centravam-se na tentativa de comunicar por meio de intervenções sociais
À medida que as famílias tradicionais se vão dissolvendo, torna-se imperativa a necessidade de criar outras relações. A necessidade de estabelecermos relações com outras pessoas reflecte a procura generalizada de um sentimento de pertença e a busca de identidade por parte dos colectivos étnicos ou culturais. O medo da solidão é relevante, uma vez que remete para a questão da própria identidade, seja ela individual, colectiva, étnica ou cultural. Nas peças que produzi durante a residência na Binaural/Nodar, tentei criar relações com outros que me são estranhos. Nodar era o local que cumpria na íntegra a concretização deste trabalho, porque a ideia de comunidade está sempre presente.
Os trabalhos que produzi exploraram criticamente a natureza ritualizada das convenções sociais, tentando criar espaços em que essas convenções pudessem por um momento se desestabilizar. Antecipei também que este trabalho pudesse levantar muitas outras questões, como o papel do público e do artista, a dinâmica do interior/exterior, bem como o papel específico do contexto local. Existe um contexto histórico e contemporâneo para as obras de arte que convocam os participantes em eventos, performances e situações. Em tais situações, o significado é tão instável quanto o público é heterogéneo. Diferentes origens, crenças e níveis de consciência contextual desempenham um papel relevante na criação de discursos múltiplos e contraditórios a respeito do significado das acções dos artistas.
Estas situações constituíram uma extensão do meu trabalho anterior, em que pretendia encontrar novas formas de estabelecer ligações dentro de uma comunidade alargada. Comecei a estabelecer situações sociais, “activadas” em 2003 enquanto completava o meu Mestrado em Belas Artes no Chelsea College of Art, em Londres, Inglaterra. Estas performances reflectiam sobre a necessidade do contacto humano na sociedade contemporânea e até onde eu conseguia ir para obter esse contacto. Pretendia igualmente testar os limites daquilo que é socialmente aceite. Na peça denominada “Blue Hammer” (apresentada na Transmediale de 2006 em Berlim, Alemanha, e na Nunnery Gallery em Londres, Inglaterra, em 2006) fui a uma loja de ferragens e criei uma “situação activada” fazendo um teste promocional. Pedia aos clientes que me dissessem qual o martelo que preferiam, depois de testarem os martelos em exposição e, no fim, poderiam levar gratuitamente um martelo feito de gesso azul que eu lhes tinha preparado. Este martelo azul funcionava quase como um trocadilho, como uma ferramenta que simboliza um acto de força. Cada vez que eu crio uma nova peça relacional, aprendo algo novo sobre como os outros respondem a situações embaraçosas ou invulgares.
As performances que tiveram lugar em Nodar centravam-se numa transacção ou troca. Nas performances “Split Pea Soup” (“sopa de ervilhas”) criei uma “situação activada” numa loja de conveniência. A partilha da sopa foi usada como um pretexto para a interacção social. À medida que a peça se desenrolava as linhas iam ficando mais ténues e instalava-se a confusão sobre qual o papel que cada um de nós estaria a desempenhar. Nesta ocasião, eu examinava como as nossas necessidades e liberdades individuais são alteradas diariamente à medida que circulamos entre espaços públicos e espaços comerciais. O público é convidado a reavaliar o que julga ser permitido e as ideias pré-concebidas sobre a normalidade.
Este trabalho foi apresentado na Anna Leonowens Gallery na NSCAD University, Halifax, Nova Escócia, em Setembro de 2007. Foi exibido em três monitores que formavam um círculo. Os monitores estavam direccionadas para fora, vidados para as paredes da galeria, forçando o espectador a estar “encurralado” contra a parede, para ver um monitor, mas devido ao seu posicionamento o espectador só conseguia visualizar um ecrã de cada vez. Cada monitor tinha um segmento diferente da performance de três horas. Os altifalantes estavam por trás dos monitores e as sobreposições de som faziam com que o espectador fosse atraído para o próximo monitor não conseguindo ver o que estaria a acontecer no monitor actual. A localização dos monitores no espaço da galeria criou de novo uma situação embaraçosa para os espectadores perante a obra e como eles negociavam a sua posição em relação aos monitores.
Suzanne Caines é uma artista profissional formada pelo Chelsea College of Art and Design. O seu trabalho tem-se focado, através de performances em espaços públicos, na manipulação de ficção na realidade, a qual proporciona um questionamento da identidade por parte dos interlocutores. O seu trabalho reflecte também a forma como a memória existe na sociedade contemporânea, como são navegadas estas memórias e como se separa o facto da ficção. Criando novas identidades para si própria, Suzanne Caines consegue alterar a forma como os outros a entendem. Aspectos e interpretações das nossas identidades podem ser reposicionados e redefinidos num contexto pós-moderno. O seu trabalho tem sido apresentado no Canadá e na Grã-Bretanha e mereceu já vários prémios e bolsas, como o do Canada Council Grant em 2005.