“Fome, peste e guerra”. A trilogia é usada por Adelino Serrano para retratar um período difícil da história de Portugal, o Estado Novo.
Natural de Figueiredo das Donas, em Vouzela, onde cresceu no seio de um casal de lavradores, recorda um início de vida “difícil”, com brincadeiras na rua e a criação de gado.
“Os invernos eram longos” e muitas famílias “não tinham um bocadinho de pão para comer”, conta, acrescentando que “acontecia em dezenas de casas”. “A fome era uma realidade. Infelizmente, não se podia dizer que se tinha fome. Se se dissesse que se tinha fome, vinha a PIDE e prendia as pessoas. Esses algozes, comandados por aquele sacana de Santa Comba Dão, eram uns facínoras. Faziam tudo do pior quando levavam as pessoas para os calabouços”, pormenoriza, explicando que “até para se falar era preciso ter cuidado”.
Já na tropa, conta que “mais de 50 por cento dos soldados” eram analfabetos. Adelino Serrano foi destacado para Moçambique e não escapou às dificuldades sentidas na guerra do Ultramar.
No regresso, foi para o caminho de ferro, onde fez a sua vida. Entretanto, deu-se o 25 de abril. “A gente já previa que havia qualquer coisa no ar. Havia um descontentamento muito grande popular”, recorda, contando que, quando lhe falaram do golpe de Estado,
estava na estação de Mourisca do Vouga. Pediu para ouvir a rádio, onde passava música de intervenção e marchas militares, bem como a célebre frase: “O Movimento das Forças Armadas pede à população de Lisboa para se manter serena e dentro de casa”. “Mas a população de Lisboa é que não se manteve serena nem dentro de casa. Veio toda para a rua”, graceja.
Os tempos que se seguiram foram marcados pelos movimentos populares, o regresso dos retornados, o ódio e a revolta alimentada ao longo dos anos. “Passou-se da repressão para a libertinagem, com atropelos à liberdade. As pessoas estavam tão massacradas, que em determinados sítios fizeram coisas que não deviam”, aponta, garantindo, no entanto que houve uma evolução muito grande, em termos sociais, higiene e económicos.
Adelino Serrano assumiu também um papel político, como “pai biológico do PS em São Pedro do Sul”, estando ligado à sua fundação, e foi depois absorvido pela secção de Vouzela.