“Novas Expressões do Território” é uma exposição audiovisual concebida pela Binaural Nodar em 2019 para a Programação Cultural em Rede da Comunidade Intermunicipal de Viseu Dão Lafões, a qual partiu de um conjunto de criações artísticas realizadas a partir de recolhas efetuadas em paisagens e junto de comunidades dos referidos catorze municípios da região, fluindo temáticas e narrativas que propõem dimensões poéticas, não literais, do património cultural local.
CALDAS DA FELGUEIRA
Nelas
“Miracula aquarium fontium et fluminum”,
O milagre das águas, das fontes e dos rios que o velho romano Plínio intuiu serem comuns na nossa Lusitana terra.
A natureza das águas não cessa pois de obrar prodígios.
Na mesma senda, o Aquilégio Medicinal do bom Doutor Francisco da Fonseca Henriques, natural de Mirandela e médico do argutíssimo Rei D. João V lembra os futuros e improváveis leitores “A água, que sendo pura e boa pode muito entre as coisas, como que se rege a máquina do corpo, para o bom governo dele.”
Quando falamos de termas, encontramo-nos pois naquela linha ténue entre a crença e a medicina.
Por exemplo, a tradição insistia que determinados dias do ano conferiam propriedades milagrosas às águas minerais.
Nas Caldas da Felgueira, município de Nelas, o padroeiro do Banho Santo é o São João.
Da mesma forma que na madrugada de S. João, iam os pastores para o pé dos ribeiros e molhavam o gado com a água, para ficar bento, ou livre da tinha, também os homens e mulheres lavavam-se com água propositadamente benzida que protegia de doenças durante o ano.
Que lugar é este das Caldas da Felgueira?. Parece ser um lugar recente, já que ainda não era mencionado nas Memórias Paroquiais de 1758. No entanto, apesar de não se fazer menção à povoação, já se faziam referências à existência de uma “nascente quente e sulfúrica no limite da aldeia de Vale de Madeiros”, freguesia de Canas de Senhorim.
O povo foi passando a palavra desta nascente quente e começaram a ser conhecidos os Banhos ou Caldas de Vale de Madeiros, nome por que foi designada até cerca de 1880. Após esta data começou a ser conhecida como Felgueira de Cantagalo, pelo facto de o arquitecto Rodrigo Maria Berquó, que dirigiu a exploração da nascente, ser filho dos marqueses de Cantagalo.
Sendo Canas de Senhorim um lugar com bons acessos a Coimbra, a Gouveia, a Tondela e a Viseu, a pouco e pouco pessoas vindas de fora tentavam encontrar naquelas águas as respostas aos seus problemas. Após várias tentativas falhadas para dar resposta à procura crescente da estância termal e aproveitando o reconhecimento das águas da Felgueira, pela Exposição Universal de Paris em 1867, e a abertura do caminho de ferro da Beira Alta, eis que surge um homem determinado e com muita força de vontade o Sr. José Maria Marques Caldeira, que pediu e obteve a concessão da exploração das águas, formando-se assim a Companhia das Águas Medicinais das Caldas da Felgueira a 7 de Agosto de 1882. De seguida, deu-se a criação da Nova Companhia do Grande Hotel Club das Caldas da Felgueira em 1886.
Por esses tempos, o professor Dr. Manuel Bento de Sousa, escrevendo acerca da acção destas águas, disse: “O que penso e sei, o que tenho verificado, com alegria dos doentes, e minha, é que a água da Felgueira á das minerais portuguesas a melhor de todas.”
Passou o tempo, passaram famílias, gente mais simples, gente mais abastada, todos à procura do toque milagroso da água boa. O Grande Hotel Club viveu tempos áureos, grandes repastos, música ambiente, bailes, e até refugiados alemães da guerra que para lá foram trazidos, dizem que por intervenção da PIDE.
Imagino alguns destes alemães a lerem a “Montanha Mágica” de Thomas Mann e de pensarem que aquelas singelas caldas portuguesas teriam algo em comum com o sanatório de Davos onde a ação do romance se desenrolava.
Ficha Técnica
Conceito original: Luís Costa
Registos sonoros e vídeo originais de Luís Costa, Manuela Barile, João Farelo, Liliana Silva e Rui Costa
Edição vídeo: Liliana Silva
Edição sonora, textos e voz: Luís Costa
Concepção do percurso expositivo: Luís Costa e Liliana Silva
Ilustrações: Liliana Silva
Produção executiva: Diana Silva