O pai de Mário Gonçalves trabalhou, durante muitos anos, no lagar de azeite de Vale de Matos, no concelho de Castro Daire. Por isso, habituou-se, desde muito novo, aos aromas e aos afazeres próprios daquele espaço, para onde corria no fim das aulas e ao fim-de-semana.
No último ano em que o equipamento funcionou antes de ter fechado portas, em 1999, também ele foi lagareiro, uma experiência que recorda com saudade.
Este é o ponto de partida para o desfiar de memórias que partilha no seu testemunho. Conta Mário Gonçalves que tudo começava, madrugada cedo, pelo acartar da azeitona para o piso superior, de onde depois saía encanada para o moinho, acionado pela força motriz de uma vaca que era presa a uma molhelha. Com o seu movimento circular e lento à volta do pio, durante cerca de três horas, o animal ia movendo as pedras que transformavam o fruto numa pasta mais ou menos uniforme.
A massa era, depois, colocada dentro das seiras e seguia para a prensa, onde era caldeada com a água quente da fornalha, que permitia separar o azeite do azinagre. Este processo de decantação termina com o produto final a ser cuidadosamente separado para a última tarefa, de onde era recolhido, e devidamente medido, para o recipiente em que seria transportado pelos clientes para casa.
O dia de trabalho era “muito exigente”, nota o habitante. No lagar de Vale de Matos faziam-se dois ou três moinhos por dia, que rendiam conforme a qualidade da safra. Equipamento importante para a economia local, funcionava durante cerca de três meses por ano e servia não só a aldeia, mas também as povoações vizinhas de Santa Margarida e Mortolgos.
Com o frio da rua, o interior aquecido sabia bem e, nas horas mortas, servia de berço a patuscadas, com o bacalhau e a batata a murro, a sopa, o salpicão e as chouriças a serem partilhadas.
Com todas estas memórias presentes, Mário Gonçalves fala da importância de recuperar este património, mostrando-o às gerações mais novas. Por outro lado, destaca que “seria muito importante até para combater a solidão e o isolamento e para haver mais união na própria aldeia”.