Maria Alzira Lourenço passou a infância, até à quarta classe e ao exame de admissão, na Póvoa de Codeçais, freguesia de Fornelo do Monte e concelho de Vouzela. Desde muito nova se lembra que a mãe a colocava a guardar as ovelhas ou o rebanho das cabras, nem sempre tão fácil de cuidar.
“O trabalho de menino é pouco, mas quem no poupa é louco”, já diz o velho ditado. Assim, recorda que as crianças, entre a primavera e o verão, se juntavam e eram guiadas até ao monte pelos animais. “Juntávamos os rebanhos todos, depois brincávamos, deixávamo-los fugir, e às vezes só nos lembrávamos quando era para vir para casa”, graceja.
Sem estradas ou eletricidade, a quarta classe foi feita à luz de uma candeia a petróleo. Na véspera, pelo perímetro da Penoita, foi a pé até à vila, dado que o único meio de transporte existente era o carro de vacas e nem toda a gente tinha condições para ter uma junta. Numa época em que a pobreza era quase generalizada, a subsistência tinha por base a agricultura, marcada pelo trabalho braçal e por um espírito comunitário muito forte.
A primeira vez que foi a Viseu foi para fazer o exame de admissão ao Liceu, após duas horas a pé até Torredeita, onde apanhou o comboio para a cidade. Reconhece que foi “uma privilegiada” e que quando foi estudar, o mundo rural ficou um pouco para trás.
Ainda assim, há memórias que o tempo não levou, como as meias feitas pela mãe com a lã que fiava de inverno, enquanto guardava os animais no pasto, ou os caturnos que herdou do avô. Aproveitava-se tudo, até porque, como diz o ditado, “remenda o teu pano, chega-te até ao ano”.