Após a chegada ao local deparei-me com um panorama algo inóspito, quase despovoado e sem o “conforto” da paisagem citadina (de onde sou oriunda). Subitamente de forma algo bucólica, o meu olhar foi invadido por um clarão de um incêndio que se perdida no meio do monte, confundindo-se com o pôr do sol. As nuvens de um cor de laranja forte contrastavam com a arquitetura das eólicas que criam um ritmo visual e harmonioso.

As vozes dos habitantes mal se ouvem, povo reservado, simples e que não gosta de ser filmado.

Na residência artística em Nodar o meu projeto passou por várias fases. Se por um lado debrucei-me sobre as potencialidades sonoras da flora, por outro a imagem teve um papel preponderante, associada ao vídeo.

O meu processo de trabalho começou com uma documentação fotográfica e videográfica do espaço. Posteriormente passei para o desenho da arquiteturarural e concluo com as gravações de ecrã dessa ação, através de uma Pen tablet.

O material de lousa captou desde logo a minha atenção. Apropriei-me de uma placa de lousa da localidade. O seu formato remete para uma noção territorial, servindo inicialmente de suporte a uma projeção, em que foi feita a máscara virtual e física, fazendo-a coincidir com os recortes irregulares da lousa. Abandonando a máscara física apostei na virtual, em que a projeção não depende do objeto físico, pois o vídeo já contém uma fotografia com a sobreposição de várias lousas, sobre a qual são desenhados os conjuntos arquitectónicos eleitos.

O mapeamento sonoro do retiro da Fraguinha e das aldeias dos arredores, por vezes são captados da própria natureza e nalguns casos são provocados por objetosrecolhidos da própria localidade. Assim se realizou um experimentalismo casual, que depois foi conjugado na forma de edição sonora. Exemplificando, coloquei pedras no interior de tubos de plástico para a construção civil. Ao girar estes de um lado para o outro apreciei uma sonoridade invulgar, a qual não deixa de ter a sua razão lógica de existir, pela sua associação com o ruído que a ação do giz faz nas mais diversas superfícies, desde o granito, troncos de árvores que originam sonoridades pouco convencionais.

Há uma recolha sonora da água que flui à medida que as paisagens se vão construindo ou desconstruindo ao longo dos desenhos. A sintonia ou a dessintonia dos sons com as imagens, implica por um lado uma tensão, por outro uma harmonia. É neste jogo de opostos calculados que fiz auto-sustentar o trilho audiovisual.

Remetendo para as fases deste projeto, será pertinente explicar que o universo dos afetos foi tratado de uma forma continuada. Se numa primeira fase esse universo foi abordado de um forma mais evidente, através do uso das palavras escritas aolongo da faixa sonora, e assim camuflando a temática que aqui nos propomos, numa segunda fase, apostou-se na expressão de territórios rurais, traduzindo-se nos desenhos que vão acontecendo à medida em que o espectador flui pela estrutura arquitectónica. Esse fluxo leva a uma ordem desordenada, que é cortado e acionado vezes sem conta. Interessa aqui reter o que provém da sonoridade visual desse fluxo.

 

Sara Pinho  (Porto, 1977)

 

 

Licenciada em Design de Comunicação Arte Gráfica pela Faculdade de Belas Artes do Porto. Atualmente frequenta o 2º Ano do Mestrado de Criação Artística Contemporânea da Universidade de Aveiro. Trabalha como freelancer. Participa com frequência em exposições individuais e coletivas desde 2007.